A coisa toda só piorou quando, em 1994, a geração dessa década começou a se destacar e a lançar discos - tem gente que acha que ser amigo de artista lhe dá algum poder especial.
Daí um pessoal que trabalhava lá começou a ser amigo de artistas e, se o ego já era algo chato de aguentar antes disso, imagine depois!!! Mas essa coisa de se achar especial só porque conhece artista, não era e nunca foi algo apenas do universo musical, de TV e rádio, etc.
Na vida normal acontece a mesma coisa. Lembro em Brasília, depois que Plebe, Legião e Capital estouraram, muita gente que nunca teve nada a ver com a Turma da Colina se aproximou e eram justamente essas pessoas interesseiras que, uma vez próximas dos músicos, pronto, empinavam o nariz.
Eu que conhecia aquele povo todo desde moleque observava aquilo e essas pessoas mal sabiam que, na verdade, eram motivo de piada. Sabe quando a falsidade fica escrita na testa?
Enfim, iniciei esse texto com essa introdução para poder contextualizar o ambiente o qual quero dizer aqui.
Então quando entrei na MTV levei comigo, óbvio, toda minha história pessoal. Costumo brincar dizendo que tenho dois carimbos de caipira (com muito orgulho!): nasci em Piracicaba, interior de São Paulo; e cresci em Brasília, interior de Goiás.
Entrei na MTV já conhecendo os bastidores da música, desde pequeno convivendo no ambiente de ensaios, shows, gravação de demos, composições, etc. Os grupos de Brasília, desde 1983, já apareciam nas principais publicações da época como a Som Três, a Roll e a Bizz. Sempre que possível eles também participavam de programas de TV, o que era mais difícil já que eram de BsB. Mas, por exemplo, Capital Inicial participou do Fábrica do Som ainda em 1983, quando foi pra SP fazer show.
Quando cheguei à MTV meus amigos já estavam no 4º, 5º discos lançados na carreira. Quando cheguei lá já tinha minha história como músico e nem almejava mais a carreira na música. Minha história com o Rock de Brasília já existia assim como fato de eu ser o motivo da existência do Raimundos, mesmo que naquela época o Raimundos ainda não era conhecido.
Além de minha história com Brasília, eu também tinha uma história SP, porque frequentava estúdios, também tinha amigos músicos, ia em passagens de som, entrava em shows de graça, ia em festas de gravadoras, assistia a ensaios e gravações de disco...Na segunda metade dos 80 houve uma cena underground / alternativa / independente forte em SP que tocava no Aeroanta, Teatro Mambembe, Espaço Off, Broadway, Sesc, Projeto SP e outros lugares mais antigos que ainda existiam como Madame Satã e Rose Bom Bom.
Vi Raul Seixas na cadeira de rodas chegando ao estúdio Vice-Versa pra acabar de colocar as vozes no disco A Panela do Diabo; certa vez sai do Aeroanta aos papos com Caetano Veloso; frequentava camarins, rádios e TVs, e todos os estúdios profissionais; vi Titãs brigando aos berros durante ensaio para gravação do disco Jesus Não Tem Dentes...
Nunca usei essas coisas pra me gabar ou me achar especial, até porque seria ridículo.
Então eu via aquelas pessoas na MTV se achando As Bacanas Descoladas e internamente dava risada. Achava tudo aquilo ridículo. Como eu não fazia parte de panelinha alguma, então cagava e andava para a pose que essas pessoas faziam.
Estava feliz da vida em poder trabalhar com duas coisas que eu amava: música e televisão, então minhas urgências eram outras, e não ficar fazendo pose.
Tinha gente lá que morria de inveja quando chegava algum artista amigo meu e perguntava por mim, obrigando alguém a ligar pra minha mesa pra dizer “fulano está aqui e quer te ver". Eu não sabia desse negócio da inveja, mas um dia me disseram que isso acontecia.
Esse pessoal da MTV que falo chegava até a forçar certa amizade com artistas e que nem sempre surgia espontaneamente... não sei explicar bem, mas fato é que não era algo 100% espontâneo.
Mesmo tendo crescido no universo do movimento punk, eu sempre ouvi e gostei de música caipira e música brasileira em geral. Nunca abri mão da boa música brasileira.
Por causa de meu pai eu escutava Alvarenga & Ranchinho, Tonico e Tinoco, Rolando Boldrin, Renato Teixeira, entre outros artistas da música caipira (que não é sertaneja!!!). Além disso, também toda aquela geração da MPB que se firmou nos anos 70. Por causa de Brasília também escutei desde cedo Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Milton e Clube da Esquina e mais um monte de coisas de raiz, bem brasileiras, de cultura local. Coisas que, por exemplo, nos anos 90 Chico Science e Mestre Ambrósio fizeram o favor de mostrar. Brasília era e é uma mistura de culturas e tudo isso sempre fez parte da vida de quem morou / mora na capital.
Quando o mercado de CD explodiu nos anos 90, eu comecei a comprar tudo que eu tinha em vinil e também a procurar coisas novas que até então eu não tinha muito acesso, digo de música brasileira. Nesse período as gravadoras resgataram muitos discos clássicos de seus arquivos e os relançaram em edições especiais, coletâneas, etc.
A Vanguarda Paulista é outra cena que sempre gostei
muito e que também nada tinha a ver com MTV, e tudo que saia em CD eu comprava,
até porque nunca tive vinil de nenhum desses artistas, apenas fitas cassetes.
Passei a levar esses CDs para a MTV para colocar de música de fundo nos programas que eu fazia como Na Chapa e Teleguiado.
Tinha gente que tirava sarro da minha cara quando me via com um CD do Jackson do Pandeiro, quando eu colocava um CD do Almir Sater e coisas assim.
Em todos os departamentos da MTV havia aparelho de som. Eu escutava tudo o que recebia – e recebíamos sacolas e mais sacolas das gravadoras – até porque além de ser meu trabalho, eu ouvia de curiosidade, mesmo sendo Vinny ou Alexandre Pires. Era absolutamente normal também tirarem sarro da minha cara por eu escutar tudo, e não só o que não era rock descolado.
Certa vez estava eu no departamento escutando O Descobrimento do Brasil, que era o mais recente da Legião, e passou uma pessoa e fez uma piada com a situação (não lembro o que foi dito) mas eu, também na brincadeira, prontamente retruquei dizendo para a pessoa que não era eu que um dia tive pôster do Cinderalla, Skid Row e Bon Jovi no quarto. Como a pessoa era dessas que queriam ser descoladas e escutavam Beastie Boys e Beck, então ela ficou sem graça e, sem jeito, veio até mim pedir baixinho para que eu não falasse mais aquilo. Eu dei risada, disse pra ela ficar tranquila e que eu não tinha esse passado vergonhoso. Mais tarde eu disse a ela: muito grupo que você escuta hoje, eu escutava há 10 anos no minimo. Mais uma vez ela ficou pequena.
Isso era chato, ter que aguentar esse pessoal que se achava descolado só por estar na MTV. Coisa mais boba.
A mesma coisa acontecia quando me viam ler a Contigo. Tiravam sarro, pela revista ter esse perfil de fofoca de novela, mas na verdade era a principal revista sobre TV. Era onde se falava algo de bastidores, uma entrevista com Denis Carvalho aqui, Jorge Fernando ali... E ninguém se tocava disso, até eu dizer essas coisas sobre a Contigo. Aí faziam cara de bunda. Até tinham outras revistas de TV que chegavam na MTV, mas a de maior peso sempre foi a Contigo. Era uma época que não havia computador ou celular.
Cada um faz o que quer. Eu não tinha e não tenho nada a ver com isso. Só não aceitava a arrogância desse pessoal que queria parecer o que não era e ainda se achar no direito de tirar sarro do que não era "descolado".
Esse troço de fazer pose, ao mesmo tempo em que é ridículo, também é triste, por isso, o meu sentimento era de pena dessas pessoas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário