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Área de shows e pista de dança |
Bem em frente ao Aeroanta tinha um calçadão e dois botecos, um ao lado do outro. Colado ao Aeroanta também tinha o Bar do Milton, o boteco mais freqüentado. Eles serviam de ‘esquenta’ para o Aeroanta e, antes de pagar para entrar, usávamos todos os contatos possíveis para a entrada ser na faixa.
Bem na frente, onde ficava a bilheteria, tinha um tanque com carpas e sua mureta tinha uma tábua de madeira envernizada que nos permitia sentar. Já nos anos 1990, bem no início, surgiu o tiozinho do cachorro quente (esqueci o nome dele) que tinha uma Brasília vermelha escura.
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Flyer com programação |
Só que pra falar de Aeroanta é necessário voltar para a segunda metade dos 1980, mais precisamente 1987, pra acertar no alvo digo fevereiro de 1987.
Okotô |
Logo de cara o Aeroanta virou referência, e era um período de transição, a chegada de uma nova geração. Ainda tinha Madame Satã, Rose Bom Bom, Ácido Plástico e surgiram Aeroanta, Dama Xoc e Nation, anunciando novos tempos.
Novas bandas tentavam um lugar ao sol, como Nau, Gueto, Violeta de Outono, Musak, Lagoa 66, Fábrica Fagus, Picassos Falsos, Hojerizah, Kongo, Conexão Japeri entre outras.
O dono era o Roberto Pandiani, ou melhor, Beto Pandiani, e para os mais íntimos Betão. Ele teve diversas casas noturnas, foi barman nos anos 1980, e no final dos 1990 abandonou tudo para se dedicar ao esporte. Seu negócio é velejar. Beto é craque, já ganhou prêmios, fez navegações históricas, lançou livros e faz muita palestra. Não, eu não era amigo do Beto, mas sempre nos víamos lá, rolava apenas um cumprimento formal.
A proposta na época era diferente. Pouca gente se lembra, mas bem no começo, o Aeroanta abria cedo, tipo 19h ou 20h para as pessoas irem jantar. A casa era dividida em duas: o bar e restaurante; a pista e o palco. Até certa hora da noite um grande portão de ferro ficava fechado, separando os dois ambientes. A partir de determinada hora (22h talvez), esse portão se abria e se tornava um ambiente único. Nesse início a pista de dança também era um ponto forte, e apesar de rolar, digamos, coisas menos alternativas, o pessoal dançava.
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Hoje. Onde está o Aeroanta? |
Desde o início sempre estive envolvido nos bastidores de shows do Aeroanta, sempre acompanhando amigos ou por causa de Binga, a quem eu acompanhava e também trabalhava como roadie (em 1987 eu não conhecia ninguém em São Paulo). Quem cuidava dessa parte artística era Geraldo D’arbily, Biba Fonseca e Deyse (que depois se tornou empresária do Raimundos). O camarim (de cima) tinha banheiro, um ambiente com espelho, sofá, cadeiras e outro que ficava a geladeira, pia e mesa com comes e bebes. Era costume de Geraldo receber as bandas com a geladeira repleta de água, refrigerante e cerveja, uma garrafa fechada de Red Label, além de uma mesa com pães, frios, patês e frutas. Isso era para qualquer artista, independente de sua fama. Frequentei aquele camarim muito. Até arrisco em dizer que um dos últimos artistas a usar o camarim de cima foi Os Mulheres Negras.
Ratos de Porão |
Mas esse começo era assim, você automaticamente ganhava respeito de todos ao tocar no Aeroanta. Não era para qualquer um. O palco era espaçoso, porém, não muito grande; o equipamento de som era de primeira, inclusive a monitoração de palco. Era um ambiente intimista.
Também aconteciam festas fechadas, e elas eram boas. Numa dessas eu vi show do Paralamas. Também lembro de uma festa a fantasia, onde estava Caetano Veloso. Eu estava com amigos e ele ficou interessado em uma das garotas que estavam junto comigo. Por coincidência saímos para ir embora ao mesmo tempo e Caetano foi conversando com ela até chegarmos aos carros, que estavam estacionados na mesma direção. Dei boa noite e apertei a mão dele. Nada aconteceu entre ele e minha amiga. Só ficou na paquera rsrs.
Público no show do Rip Monsters. 1993. |
O show do Live também estava abarrotado, mas eu fiquei no Milton tomando cerveja, quando resolveram abrir os portões para o ar circular (a saída de emergência que ficava de frente para o palco). Todo mundo que estava na rua pôde ver o show. A banda estava em plena evidência.
Sempre rolavam pequenos festivais que o Aeroanta fazia. Neles tocavam quatro ou cinco bandas, cada uma cinco músicas, e o lugar ficava abarrotado. Houve época em que os domingos eram reservados às bandas que estavam começando. A programação sempre mudava, mas era assim; ao mesmo tempo que tinha Cazuza ou Cássia Eller, tinha o festival A Barulheira com Pin Ups, Killing Chainsaw e Garage Fuzz.
Nas festas fechadas também aconteciam apresentações e jams antológicas - as famosas Aerojams. Nem dá pra listar tudo o que vi naquele palco. De 1987 até 1995 vi ao menos 70% dos shows que aconteceram lá. Naquele palco tocou de tudo. Cada festa tinha seus artistas convidados. Acredito inclusive que estava na noite de lançamento da coletânea Não São Paulo 2. No final acabava tudo em Jam. Inclusive o Aeroanta foi pioneiro em fazer shows temáticos, que depois se espalharam com as bandas covers. As noites de black music, Black Night, marcaram época e eram bem disputadas. Também tinha a Reggae Night. O 1º show do Skank em SP foi lá para um Aeroanta vazio.
Filhos de Mengele. Último show do Aeroanta. abril/1996 |
Aos poucos a separação de ambientes deixou de existir. A pista de dança foi perdendo sua força. Havia o som ambiente, as luzes, o clima, e quem quisesse podia dançar, mas o interesse maior era o bar e os shows.
É completamente cabível um livro sobre o Aeroanta. Foram muitos shows, muitas baladas. Ora inicio de noite, ora fim de noite. A estréia do Angra aqui no Brasil, com uma fila que virava o quarteirão, a muvuca constante nos botecos, o trânsito que ficava na frente, os pais deixando as filhas. O movimento era constante, até porque o Aeroanta fazia parte do rolé noturno, todo mundo passava de carro por ali, diminuía a velocidade, observava a movimentação, as vezes parava, as vezes não. Tinham dias caídos, e dias maravilhosos.
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Beto Pandiani |
Desde que consegui formar minha primeira banda em São Paulo, passei de 1988 até 1991 tentando tocar no Aeroanta e nunca consegui. Mas, por ironia, em 1996 fiz um show lá com o Filhos de Mengele (por enquanto no Youtube). Era uma reunião decidida de última hora para comemorar 10 anos da formação clássica. Aconteceu em 23 de abril de 1996. Esse foi o último show do Aeroanta, que no dia seguinte literalmente fechou as portas. O corpo de bombeiros foi lá e lacrou tudo.
Eu estava lá no começo e eu estava lá no fim.