17 de novembro de 2011

JP e Seu Cabelo de Maconha

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JP e Seu Cabelo de Maconha*

Desde as 4 da manhã JP tentava se livrar de mais um grupo de ninjas. Dessa vez eram só 3 (no início eram 11). A perseguição começou ainda dentro da Universidade de Roundup (RU), em meio à plantação de milho do departamento de agronomia, e se estendeu para a estrada ao fundo da Universidade, e chegou a 20 quilômetros longe de lá. JP é dono de uma resistência fora do comum, mas isso não impedia de despistar os ninjas, que surgiam do nada a cada instante.

JP chegou a uma vila operária abandonada onde havia várias casas vazias, escolheu uma delas e entrou para se esconder. Entrou e começou a procurar alguma coisa que nem ele mesmo sabia o que era: comida, roupa, arma, qualquer coisa. Acabou achando um cobertor velho e furado, material de limpeza, espetos de churrasco, jornais e revistas velhas. Aproveitou para usar o banheiro e tomou um banho frio, com a escassa água que saía da torneira.

Ele precisava despistar os ninjas e ter certeza de não ter ninguém de olho nele. Por isso, propositalmente corria na direção oposta de onde queria ir. Logo que achou os arquivos no departamento de geografia, teve a ideia de esconder documentos, roupas e dinheiro em um buraco no meio do deserto, 10 quilômetros de distância de Roundup. Agora era preciso usar seus pertences escondidos. Sabendo que todos iriam procurá-lo no Brasil, foi para New Jersey, para casa de um velho amigo dos tempos da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).

Ali na casa abandonada, entrou em um armário embutido e lá ficou quieto. Não queria sair durante o dia, pois estava muito quente. Então resolveu tirar um cochilo ali mesmo, para sair a noite, quando seria mais seguro. JP saiu da ducha e se enxugou com o cobertor velho e sujo. Quando terminou de se trocar, escutou barulho fora da casa. Olhou pela janela e viu os 3 ninjas procurando-o pelas casas. JP só tinha mais uma cápsula de fumaça, resolveu então pegar um pedaço de seu dreadlock seu e colocar fogo nele. Cortou um pedaço com o canivete, colocou-o no chão no meio do banheiro e pôs fogo nele.

Saiu do banheiro agachado e entrou no armário embutido do quarto onde estava. A fumaça intensa e forte chamou a atenção dos ninjas. Assim que entraram no banheiro, já ficaram tontos com a fumaceira e logo em seguida JP surgiu pegando-os de surpresa e já jogando a cápsula de fumaça no chão que estourou e deixou os ninjas mais doidões ainda. Com três golpes fatais, um em cada ninja, conseguiu escapar de mais essa. Rapidamente ele saiu da casa e entrou em outra. Dessa vez mais nenhum ninja apareceu e quando anoiteceu JP colocou seu plano em prática e foi para New Jersey, onde ficaria por ao menos 2 meses. Ele precisava falar com Simone, mas não podia.
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Roundup é uma minúscula e discreta cidade do estado de Montana, nos Estados Unidos. A população é de pouco mais de 2 mil pessoas. A 20 km de lá fica a Universidade de Roundup, direcionada apenas a pessoas superdotadas, ou melhor, as superdotadas das superdotadas. Ela foi criada em 1923 por um grupo de 5 amigos, também superdotados, que viram a necessidade de se fazer uma universidade especial para pessoas com inteligência fora do comum, e que necessitam de uma atenção especial, diferenciada.

Já como agente da IBE (Inteligência Brasileira de Espionagem) JP foi para a RU. Ela era enorme e, como Brasília, era plana e setorizada. Há as moradias dos alunos, dos professores, dos pesquisadores, dos funcionários. Todos com prédios e casas. Há as áreas onde ficam os departamentos (tecnologia, agronomia, biologia, geografia, medicina, direito...). Quadras esportivas, piscinas, parques, lojas de conveniência, mercado... a RU é como um condomínio residencial desses modernos, de certa forma auto suficientes, onde se mora, trabalha e se diverte.

JP foi para estudar e trabalhar no departamento de sistemas e engenharia da computação. Ele queria mais, mas a princípio seria isso. Ele foi recebido por Simone, uma brasileira paulistana que estava lá há pouco mais de um ano e estudava e trabalhava no Departamento de Biologia. Em toda história da RU apenas 5 brasileiros passaram por lá, incluindo Romero, JP e Simone.

Passados 10 meses de RU, JP já estava bem adaptado ao local e aos novos amigos. No início teve um affaire com Simone, mas agora eram ótimos amigos. Ele havia criado uma festa mensal só com música brasileira e muita caipirinha que, apesar da relutância inicial, acabou se tornando uma tradição, principalmente entre os alunos.

A essa altura também, ele já havia contado seu segredo para Simone, que também já tinha feito testes escondidos com seus dreadlocks, e constatado que eles têm um teor de THC de 34%, bastante superior ao skunk (17,5%). E foi Simone que também ajudou JP a desenvolver as cápsulas de fumaça que tinham um teor ainda maior.

Mas pouco mais de um mês depois de lá chegar e começar a trabalhar, JP desenvolveu um novo sistema de integração da rede de computadores da Universidade. Era algo menos complexo e mais seguro. Mais alguns meses foram precisos para que a direção da RU autorizasse a implementação do novo sistema. Para fazê-lo JP assinou um termo de sigilo de informações e também se comprometeu a não vasculhar o sistema (o que seria bem difícil).

Tudo começou pelo Departamento de Geografia e 80% do trabalho se concentrava no período noturno para exatamente não atrapalhar o expediente normal de aulas e pesquisas. Um mês depois, durante uma madrugada trabalhando na sala principal da Geografia, viu aberta uma porta que sempre ficava fechada. Não havia ninguém no departamento e ele resolveu entrar pra ver o que tinha. Era um pequeno depósito, um almoxarifado, com muita coisa de escritório e equipamento de pesquisa de campo. Ali achou três HDs externos e resolveu pegá-los para ver o que era. Eles estavam encostados em um canto, atrás de umas folhas de cartolina, como se estivessem escondidos para ninguém ver. JP costumava ficar trabalhando até no máximo duas da manhã, mas nesse dia foi até quatro. Em um dos HDs encontrou fotos e imagens em vídeo e de satélites de várias áreas da Floresta Amazônica. Achou tudo aquilo bem estranho, já que falava de algumas bases secretas. Não entendeu muito na hora, mas acabou fazendo um back up de tudo o que viu.

Quase dois meses depois de ter achado os HDs (que foram postos no mesmo lugar), um dia, em um final de semana, voltando pra casa depois de uma corrida pela Universidade, viu que sua casa tinha sido invadida, fato inédito na história da RU. Tudo foi revirado, mas nada foi roubado. Ficou com a pulga atrás da orelha.

Uma semana depois, dessa vez voltando de bicicleta de uma festa, eram 4 da manhã quando um grupo de 11 ninjas surgiu na sua frente e uma longa perseguição se iniciou.
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João Pedro nasceu no início dos anos 1980 em uma fazenda secular no interior de Pernambuco. Até final dos anos 1950 era uma grande plantação de cana de açúcar, uma das maiores do estado. Mas com o passar dos anos a riqueza da família foi se perdendo por maus investimentos dos sucessivos herdeiros. Assim, no final dos anos 1960, início dos 1970, a fazenda passou a investir na plantação de maconha. Governo, polícia e exército faziam vista grossa. Família de muita influência. Os trabalhadores moravam em uma vila de 12 casas dentro da fazenda.

A casa principal da fazenda era uma casa antiga do século 19, com 8 quartos, e se transformou em uma espécie de depósito de objetos de toda família: móveis, roupas, obras de arte, fotografias, objetos de decoração, discos, livros (além da biblioteca com 3.500 títulos), instrumentos musicais, equipamentos de áudio, vídeo e foto. Foi com 3 anos que JP lembra de mexer nas caixas espalhadas por toda casa. Desde então ele adorava tudo aquilo.

De forma autodidata, nessa idade já sabia ler e escrever. Desde que nasceu já se mostrava diferente. Começou a andar e falar mais cedo que outras crianças. Seu desenvolvimento era mais rápido em todos os sentidos.

Na capoeira sempre foi um fenômeno, assim como Pelé no futebol. Apesar de também ajudar no trabalho, sobrava muito tempo para brincar. Gostava também de correr de 10 a 20 quilômetros por dia, sua resistência também era diferente. Suava, mas não mostrava cansaço. Podia fazer uma maratona por dia tranquilamente. Corria por entre a plantação com as palmas das cannabis batendo pelo seu corpo suado, dos pés a cabeça. Vivia descalço e só de short.

Gostava de ler. Na casa, além dos livros em caixa, havia uma biblioteca com 3.500 títulos. Lia uma média de um livro por semana. Eram livros em português, inglês, francês, alemão, espanhol, línguas que dominava naturalmente.

Um dia quando tinha 12 anos conheceu um dos donos da fazenda, de uns 35 anos, que ficou impressionado com a inteligência dele. Com seus contatos conseguiu levá-lo para a UFPE como ouvinte, mas a experiência durou apenas uma semana, já que ele batia de frente com praticamente todos os professores. Os anos se passaram com JP deixando dreadlocks na cabeça, dando aulas para todos da fazenda, correndo pela plantação e desde os 12 se engraçando com as menininhas. Com 14 já era o galãzinho do baile da cidade. Mesmo com tudo isso, JP não era convencido, pelo contrário, era solícito e humilde. E foi também com 14 que experimentou maconha pela primeira vez, já que via aquilo como trabalho. Não sentiu nada. Tentou outras vezes, mas nunca ficava doidão.

Uma vez, durante uma festa no meio do mato, brincando com um graveto de uma fogueira, deixou-o queimar um pedacinho de seu cabelo. Na hora sentiu um forte cheiro de maconha, mas um pouco diferente, adocicado. Não teve dúvida, queimou o cabelo de novo e viu que o cheiro vinha dali. Cortou um pedaço e na primeira oportunidade na festa, pediu maconha a alguém e enrolou um baseado com seu cabelo junto.

Não deu outra: todo mundo ficou mais doidão que o normal e muito mais tempo. Todos queriam saber de onde era a maconha de gosto diferente, mas JP se limitou a dizer que apenas enrolou, e nem tinha fumado. Aquilo o deixou com uma pulga atrás da orelha e a única coisa que veio a sua cabeça depois de passar uma noite inteira pensando, foi a lembrança de correr entre a plantação desde que começou a andar, o contato de seu corpo suado com as folhas de cannabis.

Com 17 JP chegou na UFPE, mas por apenas 6 meses, pois em seguida foi para RU. Nesses anos, continuou correndo por entre a plantação, dava aulas particulares de várias matérias para quem quisesse, também dava aulas de capoeira e cada vez mais se enrolava com a mulherada (também, com sua resistência...). Nas festas da rapaziada, vez ou outra aparecia o baseado especial e todo mundo ficava louco com seu efeito e com o mistério de sua origem.


* Em 2001 fui editor de música do site tantofaz.net e, pra dar um respiro da minha área, me arriscava em escrever algumas histórias ficcionais, mas com tom de veracidade.
A primeira que escrevi foi essa do JP, agora modificada. Gostei desse personagem e passei a escrever uma espécie de novela com ele... ideia há tempos abandonada. Esta publicação é uma mistura editada de alguns dos textos já escritos sobre o personagem. É uma história, claro, puramente ficcional.

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