Quem sou eu?
Eu sou kamikaze, cara. Faço o que gosto - se não der, não deu. Agora, pior que a morte é você viver no formol. Não adianta ter sucesso, não faço essa coisa de dar grana.
Sou pedante, pernóstico, assoberbado. Uso isso caricaturalmente, para mim mesmo. Tem algumas polêmicas que eu, óbvio, lanço, pergunto e me questiono. Tem outras que eu jogo, como em um jogo de pôquer..
O Rock errou? 
Isso é um álibi. "O rock errou" é uma frase-chave que, para mim, é sensacional. E um disco de entressafra - fiquei quatro meses enclausurado meditando, namorando, meditando... Quando pensei "O rock errou" foi: "Pô, tem tantas músicas que estão iguais aos outros períodos... Então, já que errou, eu posso chegar e colocar isso como conceito. Posso colocar ele em ritmo de jazz, tocar samba, fazer uma homenagem a James Brown, dá até para fazer rock, de maneira errada ou certa.
Antes de mais nada, é um álibi para eu poder fazer o que eu acho que estou afins de fazer. O rock errou? Telefona para a Sunab. Eu não tenho nada a ver com isso.
Hooked on ClassicsBach era pop. Agora, tem coisas do clássico que eu acho um saco. John Cage, para mim, é um saco. A música tem de entrar pelo meu ouvido e sair boa..., ou sair dor. Não gosto de ver concerto em máquina de escrever - muito bonito conceitualmente. Acho até válido, como Debussy e Ravel que jogavam o piano do quarto andar - PAAN! - porque achavam que eram as últimas possibilidades deles. Bacana. Mas não vou ser eu que vou comprar um disco desse piano caindo, cara. Eu não estou maluco, está entendendo?
Chico e CaetanoQuando falei mal de Chico e Caetano, eu quis criar a polêmica. Nunca fui inimigo do Caetano e só falo mal de quem eu gosto. Além disso, usei este questionamento para ver como o próprio metiê brasileiro está usando sua própria palavra. Se é abusiva, se não é. Se é bem colocada ou não. Se é ex

cessivamente ética. Se é absolutamente hospitalar. Certas pessoas chegaram para mim: "Como você faz isso? Falar mal de baluartes?" Você acha que o homem das cavernas achou fogo como? O atrito gera fogo. Basta lidar com o atrito para que ele seja criativo. Não é o caso, como dizem, de eu querer ganhar Ibope em cima do cara.
Caetano e Chico de crachá! Por mais bem-humorada que seja aquela abertura do programa, é sintomática. Crachá, cara. Para receber um grande salário. Estou cansado de falar mal deles..., pô, Tenda dos Milagres do Caetano é linda.
Eu até tinha me proposto a trabalhar junto (no especial da Globo). Mas aí pensei: vou esperar para ver. E vi, porque - poxa - quero ter um embasamento para falar. No começo, achei um barato. Ao vivo. Agora, a conduta que o programa tomou..., achei, primeiro, uma puxação de sardinha incomensurável. Tudo bem, é uma sardinha que precisa ser queimada, afinal de contas. Agora, achei que foi a maior perda de oportunidade para que houvesse uma troca de informações maior. Ninguém pode se achar com o rei na barriga. Nem nós, nem eu, nem eles.
Pai Nosso que Estais no Céu
Eu sou um cara místico, no fim das contas. A religião é ritualística e o misticismo abstrato. Ultimamente tenho orado muito por Deus, acho que ele não é Onisciente. Acho uma irresponsabilidade, uma covardia colocá-lo numa posição de onipotência. Se Ele fosse onipotente e onisciente, não brincaria de erro com a humanidade. Mas, como a humanidade erra, estamos sofrendo - errando e acertando - em prol de urna coisa maior, de um inconsciente coletivo.
Então, acho que Deus merece ser levado por nós. Em vez de pedirmos benefícios para nós, seria melhor pedir benefícios para Ele próprio; que se resolva logo e pare de brincar

de autorama com a gente, por exemplo.
Rock in BrazilEu acho que o rock brasileiro está vigoroso. Pó, eu fui para Nova York e neguinho se amarrou. O rock é uma coisa internacional, uma linguagem realmente universal.
Agora, é preciso um método, uma vontade. Atitude e coragem, como diria Glauber Rocha, arte é coragem. Isso não acontece porque neguinho tem síndrome de macaquito. Aquele grupo, por exemplo, que é a cara do U2. O que vai acontecer? Neguinho vai ouvir e dizer: é U2. O outro é a cara do Police...
Acho que um mínimo de originalidade você tem de levar. Antropofagia digerida, destilada.
RonaldosTenho o mix deles. Achei do cacete. Poderia ter sido melhor produzido - não há falhas, mas por causa de falta de tempo no estúdio, precariedade de verba, essas coisas. Mas se existe uma coisa genuína que eu conheço são os Ronaldos. Músicas do cacete e superbem tocado.
Eu saí e fui saído do grupo, porque não há nada unilateral. Primeiro, houve problemas de stress de estrada e ingenuidade generalizada. Depois de 150 shows, ainda não tínhamos descoberto a ORTN. Enquanto as pessoas estavam ganhando trinta, quarenta milhões para fazer um show, nós fazíamos por dois e meio porque eram sempre marcados com muita antecedência. E o Guto tem família. Isso tudo foi um

a das causas.
A outra é que eu tenho uma personalidade difícil. No começo tinha também a Alice, mas ela deixou bem claro: era um ano e depois ela saía. Eram três compositores. Saiu ela, ficamos eu e o Guto. Quando estávamos elaborando o segundo LP, tinha um problema com a mulher dele, que saco! Onde ele vai, ela vai atrás...
Eu era a única pessoa que dizia "eu não agüento mais!" Eu gravei "Decadence..." já tocando guitarra, só eu. "Mal Nenhum" gravei com o (luto ainda, relutante, ele já estava insatisfeito mas não dizia. Ficava querendo me retratar: "Você está andando com más companhias, está se destruindo!" Pô, eu tenho meu metabolismo.
Não foram os Ronaldos que saíram amotinados, foi uma coisa gradual. Eu estava num pique de tomar muita heroína e eles ficavam com medo: "Go junkie, sai dessa". "Eu sei, eu sei... Sou auto-suficiente", falava. Aí fui ficando cada vez pior. Fiquei morrendo de raiva deles e eles de mim. Falei mal deles, eles de mim. Hoje sinto a maior saudade.
Rock Europeu, Rock Americano
Lá está tudo seco. São darks e eu não agüento isso. O Echo & the Bunnymen, por exemplo. O Ian MaCullouch é um puta poeta mas, musicalmente, não posso achar bacana. Tem coisas do cacete. Prince é do cacete. Mas são coisas esporádicas, não é um movimento E tanta merda. Não é que vou ficar com o dedinho para cima, não. Sou sério! Agora, não sou entediado, sou raivoso. Já que não morri até agora, entediado é que não vou ficar. Uma coisa passiva, escrota, babaca. Reclama, mas não fica impondo tédio a ninguém. Tédio já existe nas ruas do mundo.
João Luís, o LobãoO apelido vem do colégio. É porque eu como muito. E detesto aquelas coisas de "me dá um teco", "me dá um pedaço", quando estou comendo alguma coisa. Não é por sovinice, não, é porque é a minha dose. Então eu comprava a minha dose, todo mundo pe

nsava que eu comia à pampa, punha aqui um queijo quente, um cachorro quente, um milk shake, um banana split e dois sucos, isso só para mim. E comprava um hambúrguer, botava tudo espalhado na mesa de pingue-pongue e dizia: "Quem quiser toma, come esse aqui, mas não me encham o saco". Aí começaram a ver aquela coisa toda, eu comendo alucinado, e como eu sempre usava macacão, sempre uso, o pessoal ficava assim: "Oh, lobo mau, lobo mau..." E daí veio Lobão.
Punk, Heavy Metal, SilêncioSem silêncio a coisa não vinga. O punk, por exemplo, não tem silêncio. E tipo trígono na testa. Acho legal como manifestação política. O heavy metal já é outra coisa, um onanismo musical, masturbação, puberdade.
Agora, o silêncio é importante para se criar alguma coisa. É a mesma coisa que você perguntar para um desenhista se ele prefere criar uma página em branco. Tem de ter basicamente o branco, o silêncio, e daí você parte para qualquer coisa. Mas tem de ter o cuidado de não invadir muito esta paralisação, para que aquilo se torne uma coisa audível.
Um lobo solitário?O rock´n´roll é uma coisa gregária. Aí eu fui transar com outras pessoas - neste disco (O Rock Errou) o Torquato foi um produtor de estúdio que tocou guitarra, o João e o Jurim, todos me ajudaram. Me senti agregado a eles ao fazer um trabalho solo, tanto é que na contra-capa estão todos canonizados. "Lobão" era o nome da empresa... Eu acho que eu sou um cara solitário, independentemente de ser gregário ou não.
Mas eu ten

ho uma coisa de grupo muito forte - eu era baterista, e baterista tem que ser gregário. Cena de Cinema, poxa, quem participou foi o Lulu Santos, a Marina, a Blitz antes de ser Blitz - o Antonio Pedro, o Barreto... Não sou uma pessoa despótica em estúdio. Se alguém tem uma sugestão melhor que a minha, vou acatar. Quero um resultado final legal. Num disco solo eu tocaria bateria, baixo - que eu sei tocar melhor que guitarra - e guitarra também. Poderia fazer, e ainda vou acabar fazendo, por curiosidade...
Mas, por querer ser gregário, para provar para mim mesmo e para os Ronaldos, "viu, não sou tão egocêntrico assim!", fiz questão de não tocar nenhum instrumento neste disco. Muita gente tinha falado que eu estava em uma egotrip, e eu senti que precisava provar a eles que eu estava sendo injustiçado, que não era bem aquele o ponto da ferida, eu querer tocar todos os instrumentos...
Fragmentos de vários discursos
"Música tem de ter uma dose mínima de entretenimento - simpatia, empatia perante as coisas".
"Quando digo "barulho basta eu que faço", quero dizer "destas dez ao luar, basta eu a tocar! Mas para ouvir prefiro Bach".
"Me sinto genuíno musicalmente. Pode ser ruim, pode ser mal... Mas é a minha cara".
"Acho que Hitler leu Nietzsche e pirou. E ficou achando que o super-homem era o homem ....... Hitler era um pintor equivocado, que comia as fezes de Eva Braun."