O triênio final dos anos 1980 - 1987, 88, 89 - ainda teve novidades marcantes na cultura pop, ao mesmo tempo em que já anunciava novos tempos em todo esse universo.
Pra mim, foram anos intensos e de muitas mudanças, como já relatei em outros textos sobre esse período.
São Paulo ainda tinha grandes cinemas de rua, como as salas do Gazeta, Genimi 1 e 2 e o Bela Artes que ficavam na região da paulista; Comodoro, Copan, Arouche, Metro, Maraba e outras ótimas salas no centro. Nessa época não havia tanto shopping, então ir ao cinema significava ir pra rua.
O Belas Artes era ótimo porque em seu entorno havia muita coisa acontecendo. Na frente dele, além do bom e velho Riviera, tinha um bilhar e uma lanchonete que ficava 24 horas aberta (o que era raro). Tinha (e ainda tem) o Sujinho e outros lugares para comer.
Eu sempre andei com pessoas muito mais velhas do que eu e nesse inicio de São Paulo, além da Turma que eu conhecia de Piracicaba que morava em SP, também havia as pessoas do trabalho. Eu trabalhava com publicidade e todo esse pessoal gostava de filmes alternativos que geralmente ficavam em cartaz no Belas Artes.
Falar em lançamentos de cinema e música, seja qual for o ano, é algo grandioso em números, então evidente que fiz uma ultra edição e destacarei aqueles que gostei e que lembro bem. Não dá pra falar de tudo, tuuudo!
Esses foram alguns dos filmes que assisti no Belas Artes nesse triênio: Bagdá Café, Betty Blue, Down By Law, Barfly, Coração Satânico, Coração Selvagem, Faça a Coisa Certa, Mais e Melhores Blues, 9 ½ Semanas de Amor, Contos de Nova Iorque, Bird e Kids.
O cinema era o “esquenta”, porque depois do filme era comum ir comer em algum lugar pra seguir noite afora bebendo e tals. As conversas sobre os filmes eram intermináveis e ricas. Depois de assistir Barfly eu tomei um porre homérico! Ainda bem que essa noite acabou em casa mesmo, foi só passar mal e ir pra cama! Esse porre foi para o Bukowski. Não tinha como ficar sóbrio depois de assistir ao filme!
Bagdá Café, Down By Law, Faça a Coisa Certa e Betty Blue foram grandes filmes. Agora um filme que não está dentro desses anos que falo aqui, mas que vale a menção por ter marcado como acontecia nessa época aqui retratada, é o Kids, lançado em 1995. Esse filme deixou a todos boquiabertos e gerou muita conversa de bar. Em tempos de HIV os excessos do filme chamaram a atenção!
Era comum antes de ir ao cinema, dar uma volta de carro para fumar um baseado, e teve muito blockbuster legal de assistir chapado.
Eram tempos em que os efeitos especiais estavam mudando e se percebia isso em filmes como Quando os Fantasmas se Divertem, Batman, Viagem Insólita, As Aventuras do Barão de Munchausen e Amor Além da Vida. Todos eles de alguma forma mexeram com os neurônios. O Batman evidentemente teve um ultra mega marketing. Os cinemas ainda não tinham poltronas marcadas e no Gazeta, onde assisti, foi aquela correria para pegar um bom lugar assim que abriram as portas. Eu me dei bem!
O Último Imperador eu também assisti no Gazeta, mas dessa vez não me dei bem, não. Assisti sentado bem na primeira fila! Havia a sala Gazetinha, a sala Gazeta e a sala Gazetão.
Filme muito esperado foi Uma Cilada Para Rogger Rabbit, de 1988. A interação entre filme e desenho não era novidade no cinema, mas a forma como foi feito Uma Cilada… foi uma completa inovação tecnológica e de captação que abriu caminho para outras técnicas que surgiram depois. Filme bem divertido que fazia a gente ficar pensando em como essa ou aquela cena havia sido feita.
Outros ótimos filmes que completam uma boa coletânea desses três anos são As Bruxas de Eastwick, Sociedade dos Poetas Mortos, Conta Comigo, Nascido Para Matar, Bom Dia Vietnã, Na Cama com Madonna, Um Peixe Chamado Wanda e Corra Que a Polícia Vem Aí. Esses dois últimos preciso citar porque fizeram o cinema vir abaixo de tanta gargalhada. Em Corra… teve um cara que caiu da cadeira de tanto rir. Doía a barriga! Sensacional! Acredito que esses foram os filmes que mais ri em cinema na vida.
Tiveram os épicos A Última Tentação de Cristo, Um Sonho de Liberdade, A Espera de Um Milagre, O Último Imperador, Império do Sol e Os Intocáveis. A Última Tentação… assisti no finado Cine Matarazzo, onde hoje fica o Shopping Bourbon no bairro da Pompeia. A igreja católica ficou horrorizada com A Última Tentação… mas é uma ótima história. A mesma coisa aconteceu em 1985 com o filme Je vous salue, Marie, que foi proibido pela censura. Assisti a uma cópia pirata na época e achamos o filme chato pra caetano!!! Censurar esse troço!?!
Conta Comigo (Stand By Me) eu assisti logo que cheguei em São Paulo. Não lembro qual foi a sala de cinema, mas fui com dois amigos de Brasília que também moravam em SP. Não tem efeito especial algum, mas ganha pela história e pelo elenco. Um desses amigos morava no Bexiga e saindo do cinema fomos pra lá beber e discutir o filme.
O Silêncio dos Inocentes marcou porque eu estava em Campinas e fui assisti-lo com minha namorada que estudava na UNICAMP. O cinema ficava em uma esquina com uma rua dessas de uma só via, estreita. A fila para entrar na próxima sessão estava grande e invadia a rua, onde estávamos. Ao lado do cinema tinha um boteco e algumas casas só de um lado da rua, exatamente onde estava a fila.
Na rua surgiu um opala que diminuiu a velocidade, parou em frente ao bar e disparou vários tiros. A fila se dispersou, o carro arrancou e todo mundo entrou no cinema. Ficamos todos nervosos e aguardando no hall. Vimos carros da polícia chegar, mas não sabemos o que aconteceu. Filmaço que também deixou todo mundo de queixo caído. Agora, se os tiros que vimos acertou alguém, isso eu nunca vou saber…É muito filme bom! Tem os intensos como Coração Satânico com Robert De Niro arrebentando na interpretação do Diabo, e Mickey Rourke também excelente como anjo e em seu auge como ator; Betty Blue, Faça a Coisa Certa foram outros. Esses filmes marcaram também por causa da trilha sonora. Uma melhor que a outra.
Por falar em trilha sonora, o excelente Down by Law tem 3 protagonistas, entre eles Tom Waits e John Lurie (tem também Roberto Benigni que depois ficou bastante conhecido pelo horroroso A Vida é Bela). Waits e Lurie eram dois nomes em destaque no universo musical alternativo e descolado. O filme é maravilhoso, nem tem o que dizer sobre ele, mas nessa mesma época John Lurie veio ao Brasil com sua banda The Lounge Lizards pra tocar no Free Jazz, quando esse festival era de fato dedicado ao jazz. A noite estava lotada (sala com poltronas) exatamente pra ver o descolado e bonitão Lurie. Antes do show dele, rolou show de Oscar Castro-Neves que fez algo épico com uma banda incrível!
Fiquei estarrecido com o que vi, sem dúvida até hoje um dos melhores shows que presenciei. Pô, era o Oscar Castro-Neves, um gigante da música brasileira e mundial! Daí, ainda chocado pela belíssima apresentação de Castro-Neves, entra no palco The Lounge Lizards e começa a tocar um jazz chinfrin que, comparado ao show anterior, parecia um monte de bebês de fralda tentando fazer algum som com seus instrumentos. O tal Lurie só ficava fazendo pose no palco e assoprava vez ou outra seu saxofone. Um show de muita pose e quase nada de música.
Na 3ª música eu e meu amigo nos levantamos e saímos. Tomamos uma senhora vaia do público e demos muita gargalhada. Foi legal sair do show porque foi como ter que sair no meio do filme pra ir ao banheiro. Todo mundo viu a gente saindo, inclusive a banda hahaha. Jazz poser chinfrin não, né!?!
Antes de terminar esse texto quero registrar aqui algumas coisas da música que estavam acontecendo nesse mesmo período - lembrando que trilhas sonoras eram importantes e faziam parte do que escutávamos:
Bad - Michael Jackson, Like a Player - Madonna, The Joshua Tree - U2, Cloud Mine - George Harrison, Solitude Standing - Suzanne Vega, Sign “O” The Times - Prince, Appetite For Destruction - Guns N Roses, Terence Trent D’Arby, Talk is Cheap - Keith Richards, New York - Lou Reed, Among the Living - Anthrax, …And Justice For All - Metallica, Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas - Titãs, Bora Bora - Paralamas, Ideologia - Cazuza.
Quem não assistiu a esses filmes, aconselho assistir a todos eles e, se já assistiu, assista novamente!
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