Nessa reportagem destaco negativamente as falas de Max e Jairo quanto ao surgimento - naquela época - de novos grupos. De qualquer forma é um belo documento e, arrisco em dizer, deve ter sido a primeira entrevista do Sepultura com divulgação nacional.
No início de dezembro de 1986 Venom inacreditavelmente veio ao Brasil para shows em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte e Brasília. Então certamente esta entrevista aconteceu em novembro/86. A revista é de dezembro/86.
Sepultura – A Morte Vem das Geraes
Revista Metal, ano 3, nº 27
Por Paulo Sisinno
Beagá em chamas! Provavelmente desde a Inconfidência Mineira não havia tanta agitação e tumulto fervilhando nas Gerais. Mas agora a conspiração não é organizada por dentistas, alferes e coisas tais, e sim por uma massa enfurecida de garotos descontentes e suas faiscantes guitarras. Conheça aqui dois de seus grupos.
Novas bandas estão surgindo a cada dia e muitas demonstram uma garra e competência como há muito não se vê no badalado eixo Rio-São Paulo. Não por outra razão que METAL foi levada a buscar urgentemente colaborador naquela região de elevado teor metálico (aí é que entra na cena o nosso batalhador Ricardo David). Mas o papo é outro. O fato é que duas “mortais” bandas mineiras estavam no Rio para se apresentar ao faminto público carioca: Sepultura e Mutilator. Dois representantes fieis da linha “Death-Black Metal” (o Muitlator mais para o Black e o Sepultura mais para o Death, diria eu).
Metal – Vamos começar pela pergunta mais quente: como foi a escolha de vocês (Sepultura) para abrir o show do Venom em Minas?
Max (Sepultura, gui/voz): Foi na base de muito esforço e algum pistolão (risos). Sério, nós batalhamos bastante para que ouvissem e conhecessem o nosso trabalho. Mas também ajudou o fato de que um parente trabalha na firma Tempo Produções, que vai ajudar a organizar o evento em Minas. Talvez nós também consigamos abrir o show em Brasília.
Metal – Quais as expectativas em relação ao seu novo disco, que sairá em breve**?
Max: Eu o considero um disco acima da média em termos de Brasil. Conseguimos realmente um grande resultado. Certamente este disco está bem superior ao nosso primeiro trabalho, sempre na linha Death Metal.
**Schizophrenia
Metal – Uma perguntinha maliciosa. O metal tem crescido bastante em termos de popularidade, lá fora e agora aqui no Brasil. Como vocês reagiram frente ao sucesso? E se o metal entrar na moda?
Jairo (Sepultura, gui solo): Em relação ao sucesso, nós temos certeza que não mudaríamos. Não somos estrelas; depois de nossos shows nós saímos do palco e ficamos com a plateia! Nós andamos junto com a galera e isso não vai mudar. Quanto ao metal entrar na moda... eu curto o que eu faço, e o que eu faço é metal. Se entrar na moda eu continuo fazendo.
Metal – Nos últimos tempos MG tem gerado uma grande leva de grupos que fazem black metal. Vocês acreditam que isso seria resultado da repressão que a tradição conservadora mineira impinge aos jovens?
Max: Não; eu acho que é porque as primeiras bandas que batalharam e abriram espaços em Minas seguiam este estilo. Então as bandas que vieram depois imitaram.
Rodrigo (Mutilator, baterista): Eu acho até que pode ter sido um dos fatores que influíram, não o mais importante.
Metal – Como surgiu o Mutilator?
Rodrigo: Surgiu em fins de 1985. A formação era eu na batera, Cleber e Alexander nas guitrarras, Ricardo no baixo e Marcelo voz. Este último saiu sando lugar ao Sílvio, nosso atual vocalista e letrista.
Metal – Fale sobre suas letras e sua música.
Cleber (Mutilator, guitarra): Ouvimos muito Celtic Frost e Bathory, e nossa música é bem semelhante a isso. Quanto as letras, o indicado para falar sobre elas era o Sílvio, que não está aqui hoje. Mas são basicamente sobre feitiçaria, um assunto que o Sílvio curte muito e até estuda. Ele sabe a história da bruxaria desde a Idade Média!
Metal – Como vocês veem o crescimento do metal no Brasil?
Max: Por um lado é bom porque obriga os meios de comunicação a ver que a gente existe e que somos um público enorme. Por outro lado eu não acho legal ver novas bandas surgindo dia após dia. Explico: todo mundo que assiste um show fica fissurado e monta uma banda, mesmo sem saber tocar. Qualquer dia desses não tem ninguém na plateia; só no palco.
Jairo: Todo mundo pensa que é só formar uma banda e sair tocando qualquer coisa por aí. Tem que batalhar; isso exige esforço e dedicação!
Rodrigo: Acho que o tempo vai selecionar as bandas que continuarão existindo ou não.
Metal – Quais são as maiores dificuldades de se fazer metal no Brasil?
Max: Dentre as mesmas de sempre (apoio, condições técnicas, equipamentos...) destaco uma: o pessoal daqui não dá o devido valor as bandas brasileiras. Algumas bandas nacionais superam de longe outras lá de fora, mas os fãs preferem gastar dinheiro num disco importado que dar força a um grupo daqui, comprando seus discos ou indo aos shows. Tinha que acontecer com o metal brasileiro o que aconteceu com a new wave daqui (tipo Paralamas, RPM): o pessoal que gosta compra os discos e ouve como se fosse um grupo lá de fora! Isso o público do metal precisa entender; tem que acreditar no potencial do Brasil!
E assim rolou a entrevista. No dia seguinte, durante o show, as duas bandas mostraram que realmente estão dispostas a vencer. Apresentaram um show que (apesar dos eternos vacilos do “pessoal do som”) agradou em cheio a furiosa (no bom sentido) massa de pirados presentes. Em tempo: a formação do Sepultura é Max (gui/voz), Jairo (gui), Paulo (baixo) e Igor (bateria). O Mutilator é Sílvio (voz), Cleber e Alexander (guitarras), Ricardo (baixo) e Rodrigo (bateria).
Nenhum comentário:
Postar um comentário