16 de setembro de 2019

O Resgate da Memória: 51 - Sepultura e Mutilator (1986)

Nos anos 80 houve um período em que surgiram alguns estilos mais agressivos tanto de metal, quanto do punk. Era uma brincadeira saudável entre os amigos ver quem formava o grupo com o som mais "podre". Em Brasília mesmo, além dos bons grupos pesados que surgiram principalmente entre 1984 e 87, costumávamos fazer uma brincadeira que era uma espécie de batalha sonora, quando ouvíamos Slayer, Metallica, Exodus, Testament, Exploited, Dead Kennedys, Discharge e GBH pra saber quem era mais rápido e agressivo: punk ou metal? Só barulheira!
Nessa reportagem destaco negativamente as falas de Max e Jairo quanto ao surgimento - naquela época - de novos grupos. De qualquer forma é um belo documento e, arrisco em dizer, deve ter sido a primeira entrevista do Sepultura com divulgação nacional.

No início de dezembro de 1986 Venom inacreditavelmente veio ao Brasil para shows em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte e Brasília. Então certamente esta entrevista aconteceu em novembro/86. A revista é de dezembro/86.






Sepultura – A Morte Vem das Geraes

Revista Metal, ano 3, nº 27
Por Paulo Sisinno


Beagá em chamas! Provavelmente desde a Inconfidência Mineira não havia tanta agitação e tumulto fervilhando nas Gerais. Mas agora a conspiração não é organizada por dentistas, alferes e coisas tais, e sim por uma massa enfurecida de garotos descontentes e suas faiscantes guitarras. Conheça aqui dois de seus grupos.

Novas bandas estão surgindo a cada dia e muitas demonstram uma garra e competência como há muito não se vê no badalado eixo Rio-São Paulo. Não por outra razão que METAL foi levada a buscar urgentemente colaborador naquela região de elevado teor metálico (aí é que entra na cena o nosso batalhador Ricardo David). Mas o papo é outro. O fato é que duas “mortais” bandas mineiras estavam no Rio para se apresentar ao faminto público carioca: Sepultura e Mutilator. Dois representantes fieis da linha “Death-Black Metal” (o Muitlator mais para o Black e o Sepultura mais para o Death, diria eu).

Metal – Vamos começar pela pergunta mais quente: como foi a escolha de vocês (Sepultura) para abrir o show do Venom em Minas?
Max (Sepultura, gui/voz): Foi na base de muito esforço e algum pistolão (risos). Sério, nós batalhamos bastante para que ouvissem e conhecessem o nosso trabalho. Mas também ajudou o fato de que um parente trabalha na firma Tempo Produções, que vai ajudar a organizar o evento em Minas. Talvez nós também consigamos abrir o show em Brasília.

Metal – Quais as expectativas em relação ao seu novo disco, que sairá em breve**?
Max: Eu o considero um disco acima da média em termos de Brasil. Conseguimos realmente um grande resultado. Certamente este disco está bem superior ao nosso primeiro trabalho, sempre na linha Death Metal.

**Schizophrenia

Metal – Uma perguntinha maliciosa. O metal tem crescido bastante em termos de popularidade, lá fora e agora aqui no Brasil. Como vocês reagiram frente ao sucesso? E se o metal entrar na moda?
Jairo (Sepultura, gui solo): Em relação ao sucesso, nós temos certeza que não mudaríamos. Não somos estrelas; depois de nossos shows nós saímos do palco e ficamos com a plateia! Nós andamos junto com a galera e isso não vai mudar. Quanto ao metal entrar na moda... eu curto o que eu faço, e o que eu faço é metal. Se entrar na moda eu continuo fazendo.

Metal – Nos últimos tempos MG tem gerado uma grande leva de grupos que fazem black metal. Vocês acreditam que isso seria resultado da repressão que a tradição conservadora mineira impinge aos jovens?
Max: Não; eu acho que é porque as primeiras bandas que batalharam e abriram espaços em Minas seguiam este estilo. Então as bandas que vieram depois imitaram.
Rodrigo (Mutilator, baterista): Eu acho até que pode ter sido um dos fatores que influíram, não o mais importante.

Metal – Como surgiu o Mutilator?
Rodrigo: Surgiu em fins de 1985. A formação era eu na batera, Cleber e Alexander nas guitrarras, Ricardo no baixo e Marcelo voz. Este último saiu sando lugar ao Sílvio, nosso atual vocalista e letrista.

Metal – Fale sobre suas letras e sua música.
Cleber (Mutilator, guitarra): Ouvimos muito Celtic Frost e Bathory, e nossa música é bem semelhante a isso. Quanto as letras, o indicado para falar sobre elas era o Sílvio, que não está aqui hoje. Mas são basicamente sobre feitiçaria, um assunto que o Sílvio curte muito e até estuda. Ele sabe a história da bruxaria desde a Idade Média!

Metal – Como vocês veem o crescimento do metal no Brasil?
Max: Por um lado é bom porque obriga os meios de comunicação a ver que a gente existe e que somos um público enorme. Por outro lado eu não acho legal ver novas bandas surgindo dia após dia. Explico: todo mundo que assiste um show fica fissurado e monta uma banda, mesmo sem saber tocar. Qualquer dia desses não tem ninguém na plateia; só no palco.
Jairo: Todo mundo pensa que é só formar uma banda e sair tocando qualquer coisa por aí. Tem que batalhar; isso exige esforço e dedicação!
Rodrigo: Acho que o tempo vai selecionar as bandas que continuarão existindo ou não.

Metal – Quais são as maiores dificuldades de se fazer metal no Brasil?
Max: Dentre as mesmas de sempre (apoio, condições técnicas, equipamentos...) destaco uma: o pessoal daqui não dá o devido valor as bandas brasileiras. Algumas bandas nacionais superam de longe outras lá de fora, mas os fãs preferem gastar dinheiro num disco importado que dar força a um grupo daqui, comprando seus discos ou indo aos shows. Tinha que acontecer com o metal brasileiro o que aconteceu com a new wave daqui (tipo Paralamas, RPM): o pessoal que gosta compra os discos e ouve como se fosse um grupo lá de fora! Isso o público do metal precisa entender; tem que acreditar no potencial do Brasil!

E assim rolou a entrevista. No dia seguinte, durante o show, as duas bandas mostraram que realmente estão dispostas a vencer. Apresentaram um show que (apesar dos eternos vacilos do “pessoal do som”) agradou em cheio a furiosa (no bom sentido) massa de pirados presentes. Em tempo: a formação do Sepultura é Max (gui/voz), Jairo (gui), Paulo (baixo) e Igor (bateria). O Mutilator é Sílvio (voz), Cleber e Alexander (guitarras), Ricardo (baixo) e Rodrigo (bateria).



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