19 de maio de 2019

Acústico MTV


Por que o Acústico MTV não se chama simplesmente Acústico? Por ser um show especialmente feito para TV.

O Acústico MTV foi criado por um cameraman americano exatamente com a intenção de privilegiar a fotografia, os planos longos, os movimentos de câmera com começo-meio-fim.

O fato de ser acústico é proposital para também desacelerar a música, e fazê-la se encaixar nos planos lentos e artísticos, além de trazer uma apresentação diferente e absolutamente intimista (não à toa a plateia ficava sempre bem próxima aos músicos).

Aqui no Brasil essa proposta se perdeu e são poucos os Acústicos que pegaram na veia, aqui no caso, em relação ao meu gosto e ao que eu assisti. Mas disso falo mais ali na frente...

Comecei a fazer direção artística na MTV em março de 1994, e em algum momento desse mesmo ano passei a ser o responsável por todos os ‘ao vivo’ que chegavam à emissora. “Todos” significa todos mesmo, desde pequenas apresentações nos estúdios das MTVs pelo mundo até Acústicos e grandes festivais. Podia ser qualquer artista: de Roxette a Pixies. Era ao vivo, passava pela minha mão.

Minha função era assistir tudo para ver se havia necessidade de acrescentar legendas (em falas que aconteciam entre as músicas), cortar algo (Iggy Pop lambendo o sangue da fã que se cortou no braço), separar em blocos, acrescentar vinhetas, ou seja, é o que chamamos de embalar para ir ao ar aqui no Brasil. Assistia também pra ver se era relevante passar aqui.

Cada apresentação que eu assistia era uma aula de produção e direção de show, seja de como fazer ou como não fazer. Eu assisti a todos os Acústicos internacionais de meados de 1994 até 2000, quando sai de lá.

Nunca fiz direção de nenhum Acústico, e o único que me coloquei a disposição pra fazer foi o do Paralamas que, ainda bem não fiz!

O do Legião Urbana lançado em 1999 como edição especial fui o responsável pela edição e toda a pós-produção de vídeo. Foi bastante trabalhoso por eu não ter material suficiente pra trabalhar. Já escrevi sobre ele aqui no Sete Doses.

E pra mim há dois Acústicos da MTV Brasil que são exemplos de Acústicos de verdade: o do próprio Legião e o do Gilberto Gil.

O do Legião é o mais intimista de todos os da MTV Brasil e um dos mais intimistas de todas as MTVs. Foi gravado em clima de piloto, o próprio grupo não levou a sério, fazendo um único ensaio na casa de Renato, a tarde, com dois violões e Bonfá sem nada pra fazer hahaha. É um Acústico incrível, honesto, puro.

O do Gil é um primor na direção artística de Rodrigo Carelli e de toda a produção, não só da emissora, mas a do Gil também. Figurino impecável, banda impecável, versões impecáveis. Até hoje assisto a esse Acústico com o mesmo prazer da primeira vez. Carelli gravou tudo separado e o montou na ilha. Seguiu perfeitamente a proposta inicial do projeto.

Dos gringos, é difícil lembrar de todos, foram muitos, mas me chamaram a atenção e gostei muito do Cure, Live, REM, Sheryl Crow, Kiss, Lenny Kravitz, Café Tacuba e Nirvana. Me parece que o Cure fez dois, mas me refiro ao primeiro em que todos estão sentados no chão em roda. Maravilhoso! O do Live os violões são incríveis, REM também bastante intimista, o da Sheryl também. Tem mais Acústicos legais, mas não consigo me lembrar de todos, claro. Na gringa eles eram produzidos em maior escala, os artistas se preparavam pra eles, havia uma produção por trás, mas nunca teve a importância que teve para o mercado fonográfico aqui do Brasil.

A partir do Acústico do Titãs, uma áurea ridícula se fez em torno do projeto. E o do Titãs, assim como o do Moraes Moreira, já não gostei nem um pouco.

Não estou aqui pra apontar culpados, mas no Brasil deturparam a essência do projeto. A culpa é um pouco de cada parte envolvida, incluindo o próprio artista.

Depois que o Titãs vendeu 2 milhões de CDs e não sei quanto de DVDs, resgatando o grupo que não estava nada bem na carreira depois do não tão aceito Domingo, tanto gravadoras, quanto artistas, todos queriam seu Acústico. Se tornou uma corrida de cegos, e a MTV Brasil não tinha estrutura para tanta demanda.

Cada produção passou a ser tratada como se fosse a última antes do fim do mundo. Seja Rita Lee e Cássia Eller ou Art Popular e Zeca Pagodinho, todos se perderam de alguma forma.

Pra minha decepção, um dos piores Acústicos é o do Paralamas. Megalomaníaco, com sopro, percussão e o diabo a quatro. Aquela versão de ‘Que País é Este?” devo admitir, é uma das coisas mais tristes da carreira do grupo. Paralamas pra mim é o melhor grupo de sua geração e um dos melhores da história do rock brasileiro, mas errou feio ao fugir completamente do objetivo real do projeto.

Inclusive na lista de artistas brasileiros que fizeram o Acústico, tem alguns nomes que a carreira é praticamente feita de música acústica, então me pergunto até hoje: por que diabos fazer um Acústico?!! Virou coisa de doido hahaha.

Sei que a MTV Brasil vai voltar a fazer Acústico, mas não sei quais são os objetivos e as intenções. Só sei que vou torcer loucamente para que ele seja feito com base em sua proposta original: o artista despido de superprodução, tocando de forma intimista e acústica para câmeras que passeiam lentamente pelo palco.

Em termos de apresentação para câmera, tem coisa mais simples do que o artista no violão e percussão, tocando e contando histórias?

É isso, que o novo Acústico traga o artista mais humanizado e simples.


PS: O 1º Acústico da MTV Brasil foi com Camisa de Vênus, mas tratado como o programa piloto. Foi também bastante simples e intimista, bem parecido com o do Legião.








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