26 de setembro de 2010

Série O Resgate da Memória: 16 - São Paulo 1983

Revista Roll – ano 1 nº 3 (nov/1983)
(como sempre, ao transcrever o texto mantive sua originalidade, incluindo aí os erros. É engraçada a forma como esse está escrito, os termos e as gírias... Apenas adicionei a imagem da nota de mil cruzeiros, já que há o preço das entradas)



Endereço Certo (SP Rock)
Rock em São Paulo? Carros ruidosos nos viadutos. Rock em São Paulo? Telefones nos escritórios, caixas regostradoras, sim, rock em São Paulo.



No liquidificador São Paulo diariamente se formam, se apresentam, se desmancham centenas de grupos de rock. Pompéia – polpa do rock heavy. Vila Mariana – berço do rock: de Mutantes a Ira. Vila Madalena – rock de quintal. Rua Augusta – Jovem Guarda. Boys. Lojas de disco. Periferia. Ratos do porão e gritos na multidão. No liquidificador São Paulo diariamente se reformam centenas de milhares de grupos de rock, rumba, mambo, reggae, samba, brega, xaxado, punk, be bop...

Em Sampa tudo corre rápido. As casas dançantes abrem para durar pouco. Quando fecha outra se abre. Faz parte da tradição: Efêmeras, mas intensas. Assim foi a “Paulicéia Desvairada” – uma das primeiras casas de rock no modelo das que hoje fazem sucesso por aqui. Uma discoteca onde não se tocava apenas discoteque, com monitores de vídeo, pista dançante com jogos de luzes e shows ao vivo constantemente. Lá era gravado o programa “Mocidade Independente” (quem se lembra?) – programa de jovens para jovens. Claro que durou pouco – como os velhos iam deixar? Mas São Paulo continuou. Veio o Hong-Kong: Uma boite new wave que se tornou moda, durando pouco mais de um ano (82). Em seu palco pisaram muitos grupos de rock que estão por aí.

Garotas do Centro
Atualmente se você quer dançar e/ou assistir ao vivo um dos novos ou velhos grupos de rock paulista há alguns canais:

Por exemplo, o Napalm. Um dos mais quentes e, sem dúvida, o mais barato (1.800,00* a entrada). No centro do coração de Sampa (Rua Marquês de Itú, 392 – esquina com a Amaral Gurgel), o Napalm tem um ambiente underground, com posters punks, guerras e grupo sde rock nas paredes, entre monitores de vídeo que mostram as últimas novidades do som lá de fora. O Napalm tem uma freqüência mista de radialistas, artistas plásticos, punks, roqueiros, travestis, e outros amantes da noite que colorem suas paredes negras. As pessoas geralmente produzem um visual sobre cara e corpo, pra ir lá curtir. Lá se pode tomar algo servido pela cantora Wilma Nascimento (ex-backing de Gil e Melodia, atual Garota do Centro) e assistir bons shows de rock com Ira, Ultraje a Rigor, Titãs, Garotas do Centro, Voluntários da Pátria, Agentss, Mercenárias, KGB. Todos pisaram no palco do Napalm e tocaram para uma casa cheia e animada, apesar de escassa divulgação. “Os jornais boicotam a nossa casa”, diz Caligari, discotecário do pedaço e ex-integrante d’Os Inocentes. Boatos: O Napalm está pra fechar. Não deixem!

Titãs
Subindo para os Jardins, passamos pela boite Verdim Verdim (R. da Consolação, 2854), onde o rock pousa algumas vezes. Ali, cercado pela decoração de veludo verde, o palco atira um som em cima da platéia não tão constante e nem tão freak, mas que curte os bons shows de rock que ali se apresentam, como Titãs, Banda Performática, Sossega Leão, entre outros. No andar de baixo, bar e duas máquinas de flipper. O preço sobe para três barões*. Seguimos.

Na Rua Augusta o rock acontece nas calçadas. Ao som dos rádios dos carros ligados a todo vapor, as pessoas dançam, se flertam e passeiam entre motos rápidas e ônibus lerdos. Aos sábados de manhã, na esquina com a Tietê (no coreto da Jeaneration), temos chance de ouvir o “Ondas Tropicais”, um serviço de auto falantes musicais ambulantes organizado pela discotecária Sônia Abreu, e que leva novidades roquísticas para as ruas. Na Augusta ficamos uns 20 minutos presos no trânsito até chegar a Rua Haddock Lobo. Viramos à direita. Na esquina com a Bela Cintra saímos da poluição dos carros para entrar na fumaça de outra moderna casa dançante – o Rose Bom Bom.

Mercenárias
O Rose também oferece vários atrativos como monitores de vídeo, flippers, shows ao vivo, luzes de neon e freqüência bastante constante (média de 500 pessoas por noite). O preço é mais alto: cinco mil e meio para os homens, e quatro mil e meio para mulheres. Pegamos o cartão.

Entramos numa sala semi lotada com mesas e um balcão de bebidas, onde as pessoas conversam animadamente sob o som alto. No fim do bar, um grande visor de vidro (tipo estúdio de gravação) mostra a pista de dança no andar de baixo, sobre a qual a maioria se acotovela exultante no embalo dos shows ao vivo (no palco em frente) ou fitas com o que há de mais recente na new-wave internacional.

Há mais ou menos dois meses abriu uma nova casa do gênero: o Clash. Talvez com o maior e mais bem iluminado espaço para se dançar, o Clash começou com força total, levando já ao seu palco o Ultraje à Rigor, Voluntários da Pátria e outros grupos. Fica na Faria Lima, onde era antes a boite gay Colorido. Longa vida ao Clash!

Mil cruzeiros (um barão)
Entendidos, travaestis, amantes da noite e outros bichos ostentam seus rebolados no Village Station, no Bixiga (R. Rui Barbosa, 354), onde os shows contam com a produção de grandes festas, com ambientação especial, cenários, luzes, etc. Além da sala de espetáculos, há uma discoteque atrás, onde o som de fitas rola direto, e uma sala de vídeo e paquera.

Essas casas dançantes, além de oferecer aos roqueiros uma viagem garantida, são para os conjuntos uma nova opção de trabalho. Foi através desse circuito que se lançaram muitos dos grupos do novo rock paulista que rola por aí.

Além das casas dançantes há alguns locais de intensa atuação na conjuntura roquística. Não são espaços exclusivamente de rock, mas de rock também (e como!). Um deles é o Lira Paulistana, teatro e produtora independente que está completando 10 anos de vida. O Lira é talvez o local mais acessível para a produção de shows dos grupos que estão se lançando, pois o aluguel é barato e o Lira tem aparelhagem de som própria, além de um esquema de divulgação muito bem montado. Além disso o Lira é a primeira produtora independente do país, tendo produzido discos como os de Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção e outros. As vezes o Lira produz grandes shows ao ar livre, na praça Benedito Calixto, que fica em frente ao teatro (Rua Teodoro Sampaio, 1091).

Outro local é o Carbono 14, no Bixiga (R. 13 de maio, 363). Espaço múltiplo, com vídeos, filmes, flippers, discoteca, sala de exposição e sala de shows, no Carbono rolam sempre bons shows de rock.

E há ainda o SESC Pompéia: uma grande fábrica de artes, que teve a coragem de realizar em seus páteos, o primeiro, turbulento e talvez único Festival Punk de SP. O Sesc produz também eventos como Noites New-Wave, ou noitadas de heavy metal e hardcore, como a que aconteceu não faz muito tempo como Brylho, Titãs, Capital Inicial, etc. Lá também é gravado o programa Fábrica do Som (TV Cultura) – ao vivo às terças-feiras e indo ao ar nos sábados – que dá espaço aos grupos independentes. Tardes de sábado nos Sesc são embaladas pelas Ondas Tropicais de Sônia Abreu. E lá sempre há múltiplas atrações. Fica na Rua Clélia, 93.
Rock em São Paulo? Se ligue.



Napalm
No coração da paulicéia, Rua Marques de Itú, 392.
Preço: um barão e oitocentos. Abre depois das 22h.


Verdim Verdim
Na direção dos Jardins, Rua da Consolação, 2854.
Preço: três mil. Também depois das 22h.


Rose Bom Bom
Na esquina com Bela Cintra
Preço: cinco mil (homens) e 4 e meio (mulheres), com direito a café da manhã.


Village Station
No Bixiga, Rua Rui Barbosa, 354.
Preço em torno de 3 mil. Abre por volta das 22h.


Clash
A mais nova da noite, fica na Faria Lima. Abrea às 22h e o preço é 4 mil.


Lira Paulistana
Shows às 21h e à ½ noite, no teatro da Teodoro Sampaio, 1091, Pinheiros, preços até um pau e meio.


Carbono 14
Também no Bixiga, Rua 13 de maio, 363. Abre cedo, preços em torno de 3 mil.


SESC Pompéia
Programação dia e noite, menos às segundas. Preço varia até 2 barões.


*Nota: 1.800,00 cruzeiros
**Nota: 3 mil cruzeiros

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