7 de fevereiro de 2014

Sorte. Sorte! Sorte?

Falando de mim...

Em 2013 aconteceram dois fatos que me marcaram: o lançamento da 2ª edição do O Diário da Turma, que há muito estava fora de catálogo (e ainda muito procurado); e o fim da MTV Brasil do Grupo Abril. Dois fatos que me fizeram rever muitos velhos(as) amigos(as) e relembrar de muitas histórias legais...

Eu tinha tudo pra ser um cidadão piracicabano, engenheiro agrônomo, casado e com ao menos dois filhos (imagino eu), vivendo uma vida deliciosamente pacata, pesquisador que provavelmente ficaria visitando fazendas pelo interior paulista, pra estudar o solo, plantações, sistemas de irrigação, etc.

Mas isso se meu pai não tivesse aceitado o convite pra ir morar em Brasília para trabalhar e ajudar no desenvolvimento da Embrapa. Tive sorte!

Foi um encanamento estourado no apartamento da 309 Sul nos levou para a 111 Sul onde também haviam apartamentos funcionais da Embrapa. Alguns agrônomos moravam lá.

Foi na 111 que aprendi a andar de bicicleta e todo o resto. Cheguei lá no início de 1974 e saí em 1982. Como digo no Diário da Turma, nas minhas andanças de bicicleta (camelinho em Brasília), sempre passava pelo Food’s, lanchonete onde aconteciam shows das bandas da Turma da Colina.

Até hoje não sei como minha irmã Mila conseguiu a fita que que ela tinha com Sex Pistols, Ramones e Siouxsie and the Banshees. Isso no final de 1980. Daí em 1982 nos mudamos para a 203 Norte. Lembro bem de uma penca de gente assistindo o fatídico Brasil x Itália na Copa, no apartamento da 111 completamente vazio, com apenas a televisão. Nos mudamos em plena Copa do Mundo.

Aí a partir de 1982, no novo apartamento, passei a ter contato mais próximo com o pessoal da Turma da Colina, e por consequência com as bandas. Eu que acabei de escrever sobre ser diferente, nessa época, ter uma prancha de surf, um skate ou uma guitarra te fazia ser automaticamente uma pessoa diferente, no bom sentido. Foi nesse ano que tive contato mais próximo com música, que fui a ensaios, peguei em uma guitarra, em um baixo. Tudo muito incrível! Logo depois de frequentar os primeiros ensaios e gravá-los para levar pra casa, passei a querer fazer parte de uma banda, e comecei a escrever letras, mesmo pirralho.

Era sorte demais poder ver tudo aquilo de perto, de conhecer todo aquele pessoal doido, e fazer doidêra junto com eles. E ainda molecão aprendi um monte de coisas, desde fazer camisetas, acessórios e pintar roupas; até sobre instrumentos, gravações e bastidores da imprensa e gravadoras. Eu fazia e vendia pulseiras e coleiras de couro com tachinhas. Havia em Brasília uma única loja que vendia o material necessário.

Eu também costumava ir às passagens de som durante a tarde, sendo dia de semana ou final de semana. Ajudava a distribuir flyers (quando havia), colar cartazes, pichar os muros com os nomes das bandas e fazer qualquer outro tipo de divulgação que fosse inventada. Era o passatempo. Brasília era outra!

Aí tem as festas, os finais de semana, as histórias e, de repente, vi àquelas bandas se mandarem da cidade e se tornarem profissionais. E quanto mais o tempo passa mais você percebe que estava dentro de algo muito especial. Coisa que você não pensa na hora, porque na hora você só quer fazer! (Como diz muito bem Dinho na contracapa do livro). Daí tudo aquilo que foi feito na brincadeira dá certo e quando se percebe, o que se viveu até aquele momento se tornou especial, uma história única. Não era pra ser especial, porque não foi proposital. Mas acabou sendo!

A mesma coisa aconteceu quando eu já estava em São Paulo e entrei para a MTV Brasil, em 1993. Era um período em que a ex-emissora musical ainda tentava cair nas graças não só do público, mas também dos artistas. E eu entrei para ajudar em um dos primeiros projetos pensados exatamente para chamar a atenção de todos eles, e também da mídia. A Casa da Praia foi pensada para movimentar os artistas, as gravadoras, dar estrutura e levar os convidados para a Casa da MTV no verão. Deu certo! Puta casa legal, na beira da praia de Camburi. Todo mundo que ia lá, do pequeno ao grande artista, era bem recebido e bem tratado.

O Real ajudou a aquecer o mercado e em 1994 apareceram Raimundos, Chico Science, mundo livre s/a, Pato Fú, Planet Hemp, Skank. Bandas que já existiam no início dos 1990, mas que chegaram ao grande público em 1994. A partir daí a MTV passou a ser de suma importância para todos os artistas. A equipe que trabalhava lá era pequena. Era uma grande família. Todos ganhavam ingressos para shows, e teve uma época (que durou até 1995) que bastava mostrar o crachá da MTV que você entrava em qualquer show, inclusive os internacionais.

Íamos às mesmas festas e outras baladas. No dia seguinte todo mundo de ressaca dormia embaixo das mesas. Foi uma época também especial. Momento único. Um bando de moleques fazendo um monte de experiências na forma de escrever, com equipamentos de captação, de edição e finalização. Viagens doidas pelo Brasil e outros lugares do mundo. Essas viagens, longas ou curtas, dariam dezenas de livros de aventuras impróprias.

Podíamos experimentar porque éramos pouco assistidos. A chefia não ficava assistindo cada programa que era feito. Simplesmente fazíamos e púnhamos no ar. Era uma turma pequena, porém muito criativa. Trabalhávamos com pouco dinheiro, mas fazíamos acontecer. O primeiro VMB aconteceu sem ter um ensaio geral. Apenas tiveram as marcações. Deu tudo certo!

Casa da Praia, Todos os Festivais do Mundo, Gastão Redescobre o Brasil, CEP, Suor, VMBs e VMAs, transmissões de festivais e outros especiais. Era muita coisa bacana, na maioria das vezes feita na raça, mas trabalhava-se com tesão. Era com tesão que eu entrava na ilha para editar um programa com Black Sabbath ou Ramones.

Aos poucos esse clima de irmandade, familiar, solidário foi acabando e sendo substituído, por um clima mais autoritário (no mau sentido). Aos poucos os profissionais daquele período 1993-1996 foram tomando outro rumo, indo para outros lugares, outras empresas e outros países. Quando eu saí em abril de 2000 já não tinha praticamente ninguém daquele bom período. Algumas pessoas iam e voltavam para a MTV, mas aquela turma nunca mais esteve junta, a não ser na festa de despedida em 2013.

E foi também com o passar do tempo que todos foram avaliando e percebendo o quanto foi único e divertido aqueles primeiros seis anos de MTV (1990 a 1996), o quanto éramos uma turma de verdade. Nesse período vestíamos a camisa da MTV como se fosse uma banda, nossa banda. Éramos uma grande banda fazendo um som bem diferente do que era feito. Mais uma turma que estava fazendo história sem saber que estava fazendo história.

Realmente tive sorte de fazer parte de duas Turmas que fizeram história... e põe história nisso! Foram momentos diferentes da vida, ambos ligados à cultura pop. Dois momentos em que não só me diverti, mas que também me forneceram grande experiência profissional e de vida.

Tive sorte por duas vezes!

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