2 de fevereiro de 2018

Filosofando a Cena Atual

Tulipa Ruiz
Há algo que vem acontecendo nos últimos anos e que eu, sinceramente, acho engraçado. Falo desses eventos sobre música que vem acontecendo com mais frequência. Rodas de debates sobre o mercado independente, o mercado mainstream, o que fazer para dar certo, novos negócios... sei lá. Pra mim um monte de blá blá blá. Já participei de uns dois desses: em um fiquei praticamente calado e no outro apenas contei em detalhes como era difícil conseguir gravar uma demo nos anos 80.

Uma coisa é você juntar donos de selos independentes já consolidados com altos executivos (e/ou ex) de grandes gravadoras e pequenas que estão começando algo sério, e junto a todos eles artistas já consagrados no mainstream, artistas consagrados independentes e tals. Fazendo coisa séria mesmo, com cachês, taxa de inscrição, pocket show especiais, debates, palestras. Nunca vi nada sério assim.

Certa vez Pepe Escobar escreveu na Folha de SP que o rock se debatia em gueto e que dele não sairia. Todo mundo ficou puto, foram atrás dele e tudo. Nasi até deu porrada nele! O tempo mostrou que Pepe estava completamente errado, como as cenas dos anos 80 e 90 mostraram. O mundo era outro, o contexto outro. Ainda havia muito por vir no universo da cultura pop. Muito!

Mas se Pepe falasse isso hoje, ele estaria completamente certo. Pego emprestadas as palavras dele: hoje a cena rock/pop brasileira se debate em guetos e assim vai ser.

Não adianta ficar criando eventos que discutam o mercado, a cena independente, a mídia, redes sociais e blá blá blá. Muitas vezes o que serve pra um, não serve pra outro. É tudo muito simples e se resume de forma curta e grossa em ter talento. Ponto!

Desde o início dos 2000 quando o Napster destruiu o modelo de mercado fonográfico que havia, a ideia de ter rock brasileiro  no mainstream novamente morreu.

Veronica Decide Morrer
Não só isso, mas o mundo mudou. Até a chegada da internet e de toda essa revolução tecnológica que ainda vivemos, poucas eram as opções de diversão do jovem, e a música era a principal válvula de escape nesse contexto. Depois, com o surgimento de outras ferramentas tecnológicas, novas profissões, novos modelos de negócios, novas formas de diversão (viajar ficou bem mais fácil, por exemplo), o interesse do jovem se diluiu em outras coisas, e a música perdeu muito sua importância.

Tenho uma filha que logo irá completar 17 anos. Ela não compra cd ou vinil, e nunca se viu obrigada a escutar um álbum inteiro. Consome música virtual e são faixas soltas. Ela não está nem aí se o álbum tem um conceito, se gostou só de 2 ou 5 músicas, é com elas que vai ficar. É assim com essa nova geração que nasceu junto com o Napster. Ela vai em shows, mas sempre em festivais, como o Lollapalloza, que tem a dinâmica igual a dessa geração: tudo ao mesmo tempo agora.

Por isso não adianta fazer rodas de discussões teóricas sobre o que fazer na cena musical atual, como se destacar, como cuidar de seu negócio (no caso sua carreira musical ou selo). Acabou, a cena musical, seja ela qual for nunca mais vai existir como existiu. Não vai ter mais nem a metade da força que já teve, principalmente o rock e o pop.

Vou dar o segredo do sucesso para a atualidade: vai fazer muito show, grave suas composições com qualidade, disponibilize-as nas plataformas digitais. Se forem boas, todo mundo vai escutar. Aí pronto. Acabou. Vai trabalhar! hahaha

Naverdade hoje em dia nem adianta mais fazer um monte de shows. Eu vejo um monte de coisas novas que são bem legais, que têm tudo pra todo mundo sair cantando, tocar no rádio, na novela... no entanto, nada acontece.

Não torço contra. Adoro música, pô! Adoraria ver uma nova cena rock/pop invadindo o mainstream. Quer tocar, fazer um som, então ok, faça isso, mas não espere que suas músicas parem a multidão. Isso não vai acontecer. Não está fácil nem pra quem já tem o nome consolidado no mercado.

Em 2015 iniciei um projeto que não acabou. Um documentário musical onde conversei com músicos e executivos. Os executivos apostavam que o rock voltaria com tudo em 2016/17, incluo aí executivos de peso, que têm influencia no mercado. E o que aconteceu? Adiantou a Globo fazer “reality show” com banda de rock, novela com trilha rock ? Isso não pega mais. Como falei, o contexto é outro.

Eu também acho uma pena ver artistas talentosos com pouco público ou com público segmentado, sem espaço na mídia, mas a realidade é essa e pronto. Vejo jornalista tentando forçar uma cena e isso é errado. Debates e eventos não vão fazer a menor diferença para a cena alternativa.

Sei de artistas grandes que já venderam horrores – discos de ouro e tals, mas que hoje são um desastre de vendas com seus produtos físicos, mas que vão muito bem nas plataformas digitais. Recentemente o Ira! fez uma coletiva para lançar o DVD ‘Ira! Folk’ e te digo que só foi o César Gavin do Vitrola Verde (seu trabalho independente). O RPM lançou disco de inéditas, ninguém falou nada, a banda acabou de novo e segue o jogo. O Roger (Ultraje) e Kiko Zambianchi são do time que também não se preocupam mais em lançar álbuns novos. Se pintar uma música nova ok, incorpora no show e segue o baile.

O mesmo acontece com os artistas menores em relação aos seus lançamentos. A grande diferença está na agenda, claro! O artista consagrado que não vende mais vive dos cachês de seus shows, o artista independente é obrigado a ter outro emprego pra poder pagar os boletos.

Amo a Tulipa Ruiz, já vi trocentos de seus shows, é uma artista fabulosa, suas letras, seu domínio de palco, composições, produção, arte e design de seus álbuns. Pra mim disparada ela é a melhor de sua geração. Um talento que não se via desde Marisa Monte e Cássia Eller. E mesmo com sua grandeza artística ela não vai chegar onde Marisa e Cássia chegaram. Deveria, e muito. Mas não é mais uma realidade possível no nosso país.

O que aconteceu com a cena 80 e 90 também tem muito a ver com o momento político e econômico do país. Em uma a abertura, em outra o Real... parece ser aquela coisa de estar no lugar certo, na hora certa.

E o futuro vai ser esse, porque na hora que os consagrados forem embora, vai restar os independentes, e cada um com seu público e será absolutamente normal essa situação.

Por isso digo, não adianta ficar inventando debates sérios sobre a cena musical independente (ou não), ou sobre o futuro dos negócios, ou como criar uma cena.... É jornalista que gosta desse blá blá blá. Artista quer mostrar sua arte, e se possível viver dela.

No universo do futebol muitos são os jogadores, mas poucos são os que recebem mais que dois salários mínimos. Na música é a mesma coisa.

Hoje, mais que nunca, se você quiser fazer música deve ser por amor, e só por amor (como acontecia com a cena dos 70, onde não havia apoio, mas todo mundo se virava).

PS: Festivais alternativos não servem pra nada! Apenas se debatem em guetos.

Um comentário:

Warlen disse...

Tomara que vc esteja errado como o Pepe Escobar. Rsrsrsrs