24 de julho de 2024

O (fraco) Jornalismo das Redes Sociais

Abro este texto (também publicado no LinkedIn) com uma afirmação bastante radical, porém muito realista: o jornalismo das redes sociais está destruindo o jornalismo tradicional. A credibilidade dos grandes grupos de comunicação e notícias está em uma queda vertiginosa. São vários os motivos desta realidade, mas aqui quero me ater ao que acontece com o jornalismo que é feito para as redes sociais Instagram, YouTube e Facebook, hoje muito populares entre todas as classes sociais. Em dados atuais, de 2024, 144 milhões de brasileiros acessam o YouTube; 134,6 milhões acessam o Instagram; e 111,3 milhões acessam o Facebook.

Essa comunicação digital se tornou muito mais poderosa do que o rádio e a televisão juntos. A comunicação de massa está agora nos meios digitais dos Smartphones e das Smart TVs. As gerações nascidas a partir de 2000 não sabem mais o que é uma grade de programação de televisão ou rádio, não assistem mais TV como se assistia até meados dos anos 1990. Novelas hoje são séries ou estão hospedadas em plataformas de streaming; notícias são as que estão nas timelines dessas redes sociais populares; entretenimento tem de sobra no YouTube, TikTok e plataformas de vídeo e áudio.

Ainda hoje o jornalismo mainstream briga com o jornalismo independente que está cada vez mais forte, exatamente por causa das redes sociais. O mainstream custa a aceitar que houve uma mudança de comportamento na forma de se passar informação. Hoje não há como monopolizar ou manipular a notícia, e isso tem doído bastante nesses grupos de comunicação de dominaram o jornalismo tradicional por décadas. A história mostra que, na maioria das vezes, há relutância em relação ao novo.

Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, O Globo, Correio Braziliense, CNN e outros grupos tradicionais de notícias até agora não se adaptaram ao novo, não sabem lidar com as redes sociais e com seu público, não só pela insistência em querer monopolizar a notícia, mas pela forma como todos eles fazem o jornalismo nas redes sociais. A começar pelo fato deles todos tratarem essas redes apenas como uma ponte para seus sites e portais. Escrevem as informações propositalmente incompletas para provocar o leitor a ir para o link sugerido, porém o uso das redes sociais não são o meio e sim o fim. As redes digitais não funcionam como a televisão com controle remoto.

Uma pessoa que entra no Instagram, não quer, poucos segundos ou minutos depois, ser levada a outro endereço eletrônico através de um link, ela quer resolver aquela publicação ali mesmo, onde está. “Para saber a matéria completa clique no link” não funciona e isso já é mais do que sabido, porém, os grupos insistem no erro, insistem em achar que Instagram, YouTube e Facebook são apenas uma ferramenta de transição quando, na verdade, são canais definitivos, que necessitam do conteúdo com começo, meio e fim. Difícil entender como essa percepção não chegou às redações.

Mas para quem ainda hoje, depois de décadas da implantação do jornalismo impresso para o computador, insiste em deixar reportagens não exclusivas fechadas para não assinantes, normal continuar a não entender o universo digital. Por que limitar reportagens que qualquer pessoa pode encontrar de forma gratuita apenas para quem pagar pelo conteúdo? Não faz sentido.

Qual o problema desses grupos tradicionais em se adaptar de forma correta às redes sociais?

Pior de tudo isso é escrever uma notícia errada (de forma proposital ou não) só para que a publicação tenha engajamento. Essa é uma prática que, infelizmente, se tornou comum. Há grupos que deixam a notícia errada, e há grupos que deixam por determinado tempo, para exatamente ter o máximo de interação possível, mesmo que ela seja negativa.

Há também uma nítida falta de experiência em querer trabalhar com o inédito e o exclusivo. Esse jornalismo das redes sociais também é um jornalismo preguiçoso, nada proativo. É um jornalismo que se basta com a notícia que surge na redação. Nitidamente não há interesse em aprofundamento, apuração, busca de novos personagens, novos pontos de vista, algo inédito e exclusivo. Esse é um jornalismo que na editoria cultural é conhecido como “reportagem de release”, ou seja, que é feita apenas baseada nas informações que constam no release divulgado pela assessoria de imprensa, sem procurar maiores detalhes ou fazer apurações.

Essa aparente preguiça é tão escancarada que é possível se deparar com a mesma manchete, a mesma chamada, o mesmo texto em diferentes contas de diferentes grupos de notícias. Eu mesmo já fiz diversos printscreen dessas manchetes idênticas.

Se todas as mídias falam que a lua rachou, porque não buscar um diferencial para uma notícia que todo mundo vai dar? Em maio de 2024 noticiaram que o ator Tony Ramos passaria por cirurgia intracraniana. Quando a notícia saiu, todos os canais de notícia correram para dar a informação, porém nenhum deles, sem exceção, trouxe detalhes como o motivo, o local, absolutamente nada. Apenas repercutiram o que a fonte inicial da notícia informou.

Passou-se dias sem ninguém dar qualquer outro detalhe: o que aconteceu, quando e como foi a cirurgia, como isso tudo aconteceu? Ninguém foi ao hospital atrás de notícias, ninguém foi atrás de familiares e amigos próximos. A mídia simplesmente esperou o boletim oficial ser divulgado pela assessoria de imprensa do hospital. Ou seja, “reportagem de release”.

Fica um questionamento: o jornalismo tradicional não sabe lidar com os meios digitais ou não quer lidar com eles?

Seja o que for, ao mesmo tempo em que o jornalismo tradicional trata as redes sociais como um modismo passageiro e apenas como uma ponte para os meios de seus interesses, de forma vergonhosa, deixa o trem da história passar.

 

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